terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Grandioso olhar pequeno

De vez em quando, volta-me uma ideia fixa:

A grandeza da vida não se faz apenas das maiores conquistas.

O mínimo múltiplo comum de duas vidas pode dar um belo sentido à aritmética da existência. Mas os olhos são treinados para enxergar, sobretudo, o grande espetáculo e acabam não percebendo a emoção das pequenas cenas. Falo de detalhes que trazem felicidade, falo de coisinhas que transformam o dia. Hoje, eu olhei o pequeno e engrandeci a vida.

Olhar pequeno é perceber que o corpo não sente dor e que funciona perfeitamente mesmo quando a gente não se atenta. É ter tempo para andar lento e tomar um copo d’água depois da caminhada. Olhar pequeno é saber que matar a sede é uma dádiva.

Olhar pequeno é notar que a sementinha plantada há uma semana brotou e saber que é de uma pimenta forte. É ter certeza de que vai preparar com os futuros frutos a receita de Pimenta Tailandesa enviada por um amigo e que vai ter ótimos convidados para comungarem a gulodice.

Olhar pequeno é esquecer o macro e focar apenas no pé de jasmim salpicado de brancos delicados que a gente chama de flor. É aspirar o aroma de olhos fechados e ri porque alguém viu.


Olhar pequeno é sentir o cheiro da sombra de uma árvore antiga.

Olhar pequeno é ligar para a mãe e ouvi-la recomendar que você deve se cuidar. É não explicar que já se cuida, só para voltar a sentir o sentimento mais antigo de que tem notícia. É fazer silêncio para a grandeza disso.

Olhar pequeno é ouvir uma música que já sabe de cor, mas, desta vez, prestar atenção na letra, porque veio como o carinho de uma amiga. Eu ouvi ontem e dizia: “Eu quero aprender os mistérios do mundo pra te ensinar...” Eu quero, mesmo que o mistério seja pequeno.



Olhar pequeno é receber palavras de amor no celular e essas palavras fazerem chorar, porque vem de uma pessoa tão especial e querida quanto uma filha. É receber um telefonema da Alemanha e ser a irmã perguntando: “Passou a raiva?” É dar boas gargalhadas e, ao desligar, viajar num tempo de ternura – que não é passado nem futuro.

Olhar pequeno é saber ler nas entrelinhas do comentário de uma amiga o que não veio escrito. É gostar do que lê.

Olhar pequeno é estar com alguém que te pergunta sempre: “Já disse o tanto que eu te amo hoje?” É responder que não, só para ouvir de novo.

Olhar pequeno é ter certeza de que chá relaxa, que floral faz bem pra alma, que quiromantes mentem de verdade e que o horóscopo está certo – se a previsão for boa. É jogar I-ching e ler todo o Hexagrama 13, mas só fixar a frase: "É propício atravessar a grande água". É jurar que entendeu tudo e que esta é a sua praia. Foi o que eu fiz agora. Quer jogar também? Clique aqui. Mas volte logo. Tenho algo importante pra dizer:

Olhar pequeno é abrir os olhos e enxergar a vida grande.