segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Reprise

Repito, porque a vida exige. Repetir é pisar no chão conhecido, é comer o pão de todo dia e saciar a fome do vivido. Repetir é reconhecer. E, às vezes, conhecer mais. Abaixo, um texto antigo que combina com o sentimento novo. Quem sabe também te inspira?

Vou cuidar do meu jardim

Ela disse que acordou de madrugada e, ainda com sono, meditou por um longo tempo. Depois, foi à cozinha preparar o café-da-manhã junto com todos os outros participantes. As mãos trabalharam muito e os lábios permaneceram em silêncio respeitoso. Na hora da refeição, o silêncio foi quebrado pelo mastigar dos afoitos, o que a incomodou um pouco. O dia seguiu sem pausas e a próxima tarefa foi cuidar da horta. Ali, de cócoras, ela se lembrou de que não seguiu o ritual de todas as manhãs e que o intestino já reclamava da posição. Não contou mais nada, porque as risadas não deram chance às palavras. Ela apenas ria do sufoco passado. Como risada é contagiante, também ri e não pensei mais no assunto.

Dias depois, eu cortava alho em fatias delicadas, quando pensei no quanto gosto do que é minucioso, do fazer sem pressa. Gosto de tarefas que poucos suportam. E agradeço se houver silêncio nessas horas. É porque “viajo” muito. Se há palavras, elas me atropelam. Então, estava ali, entregue ao pensar sem me concentrar – que é uma espécie de meditação – quando me lembrei do retiro no mosteiro zen, motivo dos risos da minha amiga. Pensei que adoraria preparar o café-da-manhã em silêncio após uma longa meditação. Então, veio a questão: será que eu sou zen?

Repassei o roteiro do dia no mosteiro e descobri que adoraria cuidar da horta, mexer com a terra, sujar as mãos, pisar no chão. Adoraria ficar um fim de semana sem carne, sem cerveja, sem excessos de qualquer espécie. Definitivamente, eu não pegaria carona com o casal que abandonou o retiro no dia seguinte à chegada. A partir desta constatação, fiquei chocada. Como é que eu nunca considerei isso relevante?

Encontrei algumas respostas. Uma delas é que preciso andar sozinha. Optei por fazer o meu caminho com meus próprios pés, com meus olhos, com minhas mãos, com meu coração, com meus erros e acertos, optei por ouvir a minha alma sempre que for preciso. Não digo que tenho tantos conhecimentos que possa andar só e me manter sempre confiante. Não é assim. Mas, para isso, existem os amigos e suas experiência que contam; para isso, existem os livros, os filmes, os acasos, os pequenos milagres; para isso, existe um universo de possibilidades. Portanto, falo, leio, vejo, ouço e, na hora de escolher, confio em mim. Preciso dessa espécie de fé, cuja metáfora mais cabível é de dar asas a quem salta no abismo do desconhecido. Isso me conforta e encanta.

Canto mantra se o entendo, leio a Bíblia se me agrada, rezo um Pai Nosso quando a situação complica, tendo água benta, eu tomo, faço novena se for preciso, repito palavras mágicas jurando que acredito. E se a questão era ser ou não ser, encontrei minha resposta: sou e não sou. Agora, com licença, porque, como disse o Cândido, de Voltaire: "isso está certo, mas devemos cultivar nosso jardim". O meu já deu algumas flores este ano e estou cuidando para que, em 2010, floresça o melhor de mim.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Tem resposta

Estou beirando a resposta. Ando pensando no assunto mudança, rodeio daqui, aprofundo dali e quase antevejo a revelação. Cabe dizer que isso tem a ver comigo e com meus sentimentos. A resposta que está vindo é minha e pode ou não servir para você. Se servir, dividiremos isso. Se não servir, pelo menos pode conduzir à própria pergunta.

A minha resposta começa a chegar com o insight de que "não tem encontro sem busca". Quem não pergunta não escuta. Eis o início: eu questiono, tu questionas, ele questiona. E o final: eu ando, tu andas, ele anda.

Gosto quando leio Saramago e percebo que há, o tempo todo, algum tipo de questionamento pairando nas entrelinhas. Quando, no livro Caim, ele pergunta: "Por que o senhor não me impediu?" Eu não duvido de que ele encontrou a resposta para a morte de Abel ali, naquela pergunta. Que espécie de senhor seria esse, que gostaria de ver sua criação acomodada e covarde?

Questionai, homens!

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Por que você não muda?

O vídeo foi indicado por uma amiga. Fui lá conferir. A pergunta soou clara logo no início: Por que você não muda? Não penso que o problema é só meu. Não, é do mundo. E é difícil mudar. De tudo o que vi e ouvi, ficou a sugestão da pergunta. Será que eu serei honesta o suficiente para responder? Ou, antes, será que consigo ir até onde está a resposta? Talvez, com meditação. Mas, para meditar com a disciplina necessária, eu preciso mudar. O que eu faço primeiro? Bem, perguntar já é um começo.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Lembrando de mim

Não tem problema se eu me esqueço de ligar para a amiga que não vejo há semanas. Não tem problema se a minha mãe espera o telefonema que não vem. Não tem problema se encaro o trabalho com uma disciplina férrea e meto a cara sem descanso. Não tem problema se nem cobro o preço justo. Não tem problema, porque eu tenho os amigos, mãe, irmãos, companheiros de trabalho e namorado na mais elevada consideração.

Foi nisso que eu acreditei. Eu só não percebi, que esquecendo a amiga, a atenção com os que amo e o tempo certo para criar, eu me esqueci de mim. Então, fiquei doente, doeu e me lembrei de um amigo que entende muito de leitura corporal. Ele diria que o corpo deu um grito e ficou doente, para que a alma não adoecesse. O corpo adoece para indicar os bloqueios que eu crio e que impedem a paz e a felicidade.

Deitada na cama do hospital, enquanto observava a médica encher a seringa – que para mim e que iria doer muito –, fiquei surpresa com a minha coragem. Agora, eu sei que não gritei, porque o grito já havia sido dado antes. O que eu vou fazer do dia de hoje, em que a dor passou? Vou parar para escutar aquela voz que vem de dentro e saber o que ela quer de mim. Então não sei o que eu mesma quero? Sei, só que me esqueci.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Quase chove

O vento soprou forte, algumas nuvens apareceram, mas logo se dispersaram. O ar ficou parado e a poeira ficou suspensa. Uma palavra traduz tudo: sufoco. Quase choveu, mas não foi ontem ainda. Dias assim me lembram alguns momentos da vida, quando tudo fica parado e não pinga nem mesmo uma alegriazinha.

Clarice Lispector já escreveu sobre esta necessidade de chuva no livro Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres. A personagem sofre com a secura e o calor num final de dia e a catarse dar-se assim:

"Ela só percebe que agora alguma coisa vai mudar, que choverá ou cairá a noite. 
Mas não suporta a espera de uma passagem, e antes da chuva cair, o diamante dos olhos se liquefaz em duas lágrimas. E enfim o céu se abranda."

Queria saber a dança da chuva. Quem sabe a vida ia chover novidade?

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Agulhas: umas e outras

Pensando em voltar pra acupuntura, penso que exige tempo. Preciso de muito jogo de cintura para manter o compromisso, mesmo quando a agenda aperta. Isso eu tenho. Disciplina também. Mas, aí, acaba me cansando como qualquer outra obrigação. Deixa de ser apenas o meu querer.

Penso também nas agulhadas mais dolorosas. Tem dia que beira o insuportável e eu suporto, porque quero ficar boa e relaxada. Fico deitada e mentalizando: "Por favor, nos pé não." No instante seguinte, lá vai a médica com mãos hábeis espetar os meus pés.

Mas nem só de dores se faz uma sessão de acupuntura. Há dias de completo relaxamento. Se chego com dor nos ombros ou se falo de uma enxaqueca recente, saio de lá tão bem que parece mágica. Difícil é não ir direto pra cama. É bom e funciona.

Agora, resta confessar o que mais gosto. É tão prosaico que me acanha dizer. Gosto de ir à acupuntura pra depois passear pelo centro, região onde se localiza a clínica que frequento. Adoro aquele monte de gente, as cores, a pressa dos que passam sem me ver, adoro as lojas com bancas fartas que prometem ótimos preços e cuja qualidade fica a desejar. É como uma viagem, vejo coisas que não vejo no cotidiano, vejo os prédios restaurados, as árvores que cresceram, o restaurante que fechou e o outro que abriu. Gosto de olhar as bancas de revistas e, sobretudo, gosto das lojinhas de aviamentos. Nestas, olho as lãs, as agulhas, os fios coloridos, as tiras bordadas e fico imaginando as peças que eu poderia tecer.

É isso, gosto de imaginar uma criação mais bonita, mais aconchegante, mas útil aos meus dias. Tivesse eu essas agulhas, não precisaria das outras. Então eu descubro que o bom da acupuntura é a descoberta do prazer.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

De passagem

Se você passa por aqui e vê que não tem nova postagem há dias, pode questionar: ela está descuidando do blog? Respondo: não. Ocorre que não sou tão zen quanto gostaria e, por que não sou, descuido-me do uso equilibrado do tempo.

É assim: surge um trabalho, eu faço; vem outro, não descarto; depois outro, aceito também. Um dia eu percebo que esqueci de mim. Não faço mais as caminhadas matinais, não vejo os amigos, não durmo as horas devidas, não deixo espaço para o que gosto. Depois me prometo mudanças. Quase consigo. Na hora das contas vencidas, dizer sim ao excesso de trabalho é tentação irresistível.

Neste momento mesmo, estou tentada a não escrever mais. Um roteiro inacabado me cobra pressa. Vou pra lá. Um dia, talvez, eu descubra a fórmula para ter tudo o que preciso, inclusive a consciência da preciosidade do tempo, da vida a ser vivida, das minhas relações. Estou aqui de passagem. A evidência da transitoriedade me leva a pensar nas escolhas que gostaria de fazer. Mas isso eu deixo para amanhã. Até lá!