quarta-feira, 21 de março de 2012

Voltando para casa - O começo

A voz soa tranquila: "Perceba sua respiração, sinta o ar fluindo para dentro e para fora... Não interfira, apenas perceba." Lanço-me nessas profundezas de alvéolo inflado. É um passeio escuro, os olhos estão fechados e guardam os últimos resquícios da luz amarelada da sala. Há um cheiro suave de jasmim vindo do lado de fora e o vento está fresco neste final de tarde. Porque eu sou dada a viagens mais elevadas, penso que o ar perfumado e quase úmido refrigera minha alma. Depois, penso que o momento podia esticar-se nesse prazer de vazio escuro. Imagino luzes alongando-se a partir de uma esfera azulada que já não é mais Terra nem nada. Há apenas o escuro fresco, o perfume e a sala.

A sensatez exclama: "fixe sua atenção no ponto entre os olhos." Sim, eu posso. Faço mais, esqueço o jasmim e não expiro pela boca. Tem que ser pelo nariz. A boca viciada em puxar o ar com avidez, enquanto o corpo estirava-se na piscina, tem que se acostumar com o novo ritmo. Essa não é uma atividade física. A sensação boa se espalha pelo corpo. É fácil sair daqui. De lá.

A luz acende-se. A moça fala o que são mantras. A intuição me diz que eu já conheço. De onde? De outros tempos? De conversas alheias? De especulações cibernéticas? Ouço com atenção o que ela diz: "Man é mente. Tra é percepção." Não, Man é mente. Tra é liberação. Também não. A mente me trai e eu esqueço. Mas o som permanece intacto, a sensação produzida é vívida. O som vibra na cabeça e gera bem-estar. Não há lá fora, a mente integra tudo e segue as ondas vibratórias, dança num espaço inexistente, flutua sem concluir, sem investigar, sem controlar. É bom perder-me nesse canto.

O começo é tímido, as palavras se sustentam num dó lamentável, mas o som impulsiona. Em alguns segundos, ouço uma voz conhecida soar numa potência estranha. É a minha voz. "De onde veio, como venceu o medo do ridículo, como eu ouso cantar tão alto?" A sensação é boa e não há medo. "Psiu, eu canto!" – sou eu ensinando para a mente. Eu entoou: "ONG NAMO GURU DEV NAMO". O mantra que precede a prática de Kundalini Yoga tem um sentido de saudação reverente à infinitude dentro de mim. Então, acerco-me da grandeza verdadeira com humildade, sinto-me pertencente a algo intangível e, no entanto, tão real que conforta, acolhe e alimenta. Vejo um filho voltando para casa.

A sensação de voltar para casa é apenas o começo. Eu me reconheço na essência do que sou. Não há espelho capaz de me revelar como me percebo na postura simples, no simples respirar e ao entoar o mantra. O mundo deixa de ter espelhos, porque tudo é uma coisa só.

Fico aqui, com a vibração do mantra movimentando a energia dentro e fora de mim. Quero compatilhar o caminho que estou descobrindo nas aulas de Kundalini Yoga, mas vou devagar. Expira... Inspira. Na semana que vem tem mais.